O CONSUMIDOR DC (DEPOIS DO CORONAVÍRUS): 7 PONTOS PARA REFLEXÃO

O CONSUMIDOR DC (DEPOIS DO CORONAVÍRUS): 7 PONTOS PARA REFLEXÃO

A hiperconveniência, num primeiro momento coisa de cidade grande, espalhou-se por cidades de menor porte e, sem dúvida, se incorporará de forma marcante, alterando estruturalmente hábitos e preferências e criando uma nova realidade com suas inúmeras vantagens e eventuais desvantagens, dentre elas o menor acesso aos pontos de vendas tradicionais;

De novo ambicioso e possivelmente prematuro, cabem algumas reflexões, ainda que básicas em vários aspectos, sobre o consumidor DC: Depois do Coronavírus, em especial na nossa realidade.

Temos em transformação um processo intenso, profundo, amplo, global e local, que envolve as mudanças que nos foram impostas, ou nos impusemos, decorrentes da combinação dos efeitos da pandemia causada pelo COVID-19, potencializada pelos dramáticos reflexos econômico-financeiros, que alteram de forma estrutural o comportamento dos consumidores. É sabido que ao longo do tempo existe um processo natural de amadurecimento e desenvolvimento dos consumidores por conta das transformações da Economia, Tecnologia e da Sociedade como um todo. Mas eventos extemporâneos, como guerras, pandemias, crises econômicas ou disrupção tecnológica intensa, alteram o ciclo evolutivo natural, precipitam ou alteram comportamentos no momento de sua ocorrência e geram mudanças estruturais que se incorporam de forma permanente.

Como contribuição para um pensar mais estratégico sobre essas mudanças comportamentais, a partir da leitura, observação, análise e a experiência de termos vivido momentos também intensos em alteração do ciclo evolutivo natural, listamos alguns temas sobre os quais deveríamos refletir e avaliar seus impactos em nossas vidas, atividades, relacionamentos, atividade profissional e negócios. E essa simples ordem na sequência já é indicativa dessas mudanças. Adiante começarão a surgir pesquisas que poderão respaldar ou alterar esses pontos iniciais de reflexão, sempre lembrando que estudos com consumidores no calor do momento, embutem uma componente emocional que o tempo costuma ajustar, ficando apenas aquilo que representa a percepção, reação e atitudes do momento.

1. Para o mundo que eu quero descer

Eis aí um fato que o calor do momento precipita. Muitos tendem a repensar criticamente seus valores pessoais e em relação à vida, à sociedade, às atividades sociais, profissionais e empresariais. De forma marcante o momento precipita um repensar mais profundo sobre o que essas pessoas têm feito, agido e se sensibilizado e o resultado será um pensamento mais crítico, cauteloso, consciente sobre temas que passavam como menos relevantes ou indiferentes. Ao contrário. Elementos envolvendo consciência social e comunitária, por exemplo, crescem muito de importância de forma geral, com a sensibilidade exponenciada pelo momento porém, passada a turbulência, permanecerão de alguma forma nas atitudes, nos comportamentos e possivelmente, uma boa parte, gerando ações e percepções sobre marcas, produtos, pessoas, líderes e negócios com os quais se identificarão mais ou menos em relação ao período AC – Antes do Coronavírus;

2. Meu espaço, meu mundo, se tornaram menores

Outro aspecto que deve emergir, influenciando comportamentos e atitudes, se refere à profunda interconexão de tudo e todos que se torna flagrante pelas limitações impostas e o convívio compulsório com a nova realidade. A começar pelo fato, inconteste, que um problema nascido numa feira de uma província na China se espalhou pelo Mundo e impõe uma nova ordem sem que praticamente nenhuma região ou população consiga se isolar do problema maior. Essa percepção, em tese, tenderá a ser mais relevante nas novas gerações que tinham tendência a um comportamento menos coletivo individualmente, ainda que muito mais sensíveis aos grandes temas coletivos sociais, como Sustentabilidade, Causa, Propósito e a busca do bem comum;

3. Mais frágil e não tem como negar 

A combinação perniciosa de fatores, liderados pelo COVID-19 e as reações de toda ordem, algumas mais passionais, mas todas destacando o caráter compulsório das restrições pessoais e sociais criam um sentimento de fragilidade individual talvez sem precedentes e talvez só comparável ao ocorrido em períodos de guerra e convulsões. Esse sentimento ocorre no plano mais geral e é ainda maior no individual já que as limitações impostas por cortes, restrições, reduções, ajustes e eliminações envolvendo toda sorte de temas, cria no indivíduo esse sentimento de maior fragilidade.

Esse sentimento deve ser percebido e reconhecido, e cabe as organizações, governos e na própria família, por suas lideranças, apoiar, inspirar e estimular uma atitude positiva em relação ao difícil quadro geral, sem criar ilusões ou alienação, mas através de atitudes que envolvam a construção e reconfiguração de um futuro melhor à frente.

No processo de reconstrução, ainda que seja quase inevitável uma fragilização financeira da maioria de negócios e organizações, poderão emergir empresas, grupos e conceitos mais valorizados por sua competência em administrar a moral, a atitude e o senso de comprometimento derivados da capacidade de sobreviver a um período com esse grau de dificuldade. E isso deve ser o tônus que equilibra esse sentimento individual de fragilidade;

4. Hiperconveniência como novo paradigma

Era um processo em natural evolução e resultado da convergência de dois fatores simultaneamente. De um lado as dificuldades, restrições, segurança e tempo envolvidos em deslocamentos, em especial nos grandes centros urbanos, que empurrava as pessoas para um comportamento demandante de maior conveniência, reduzindo especialmente o tempo e gerando facilidade e racionalidade. De outro lado, causa e consequência desse primeiro aspecto, o aumento exponencial da oferta para atendimento dessa demanda emergente, pela multiplicação de formatos e negócios mais convenientes, serviços intermediários viabilizadores e toda uma atitude mais ponderada de que conveniência custa mais do que outras soluções.

O crescimento abissal dos serviços de entregas, que vinham sendo estimulados pela compra de participação de mercado através de fortes investimentos em promoção e fidelização de consumidores já havia criado outra realidade que, agora, neste período, tem sido melhor percebida em suas vantagens e desvantagens, especialmente nesta última pelos atrasos de entregas por conta da elevada demanda. E se num primeiro momento era coisa de cidade grande, espalhou-se agora por cidades de menor porte e sem dúvida se incorporará de forma marcante, alterando estruturalmente hábitos e preferências e criando uma nova realidade com suas inúmeras vantagens e eventuais desvantagens, dentre elas o menor acesso aos pontos de vendas tradicionais;

5. Menos fidelidade, mais experimentação

Em outro artigo desta série já havíamos tratado deste tema, que é também uma aceleração de um processo natural derivado do aumento exponencial de alternativas para escolha de produtos, marcas, locais, canais e empresas. O tema aumento das alternativas de escolha foi muito explorado no livro O Paradoxo da Escolha de Barry Schwartz. Vínhamos num processo em que o aumento e promoção da oferta de quase tudo gerava crescente infidelidade no consumo, como resultado do apelo por tudo que era ligado ao novo, em especial pelas novas gerações. E o aumento da predisposição à experimentação é o outro vetor dessa mesma equação.

No presente cenário, com reflexos significativos no futuro, as contingências impostas pelo quadro instaurado estão obrigando, ou estimulando, ainda menor fidelidade e maior abertura para experimentação que, se positiva, ao mesmo tempo em que estimula a troca, favorece o comportamento mais aberto a ainda mais interessado na experimentação;

6. Mais razão e menos emoção

Não tem outra opção. A pressão desmedida a que todos estão submetidos reflete-se num crescimento inevitável do vetor razão no processo de avaliação e compras de produtos e serviços. Historicamente, por segmento ou geografia, existem pesos relativos considerados nos processos de escolhas. Por exemplo, determinadas regiões por predominância da ascendência europeia com uma cultura forjada em vetores mais racionais, tem maior peso nas decisões esse lado da moeda. Em outras, o emocional tende a ter maior peso. E ao longo do tempo e ao sabor das experiências e do momento, esse processo, do peso relativo do racional e do emocional, tende a variar, privilegiando um ou outro em termos relativos.

Mas é inegável que a extensão e intensidade dos problemas e das situações agora vivenciados tenderão a marcar o comportamento futuro dos consumidores impregnando um vetor com maior peso da componente racional por um bom tempo e, talvez, esmaecendo à medida que a experiência vivida se torne parte da história individual e coletiva. Mas a componente racional estará mais presente de forma inevitável e a comunicação, os relacionamentos e as propostas, ainda que em temas onde a emoção seja o fator dominante, como no turismo, produtos e marcas de luxo e outros, deverão ter uma sustentação mais racional para se adequarem ao comportamento emergente;

7. Foi decisivo, não será esquecido

Em todos os sentidos. São em períodos de intensa carga emocional, tensão e pressão que a sensibilidade fica especialmente atenta a tudo que toca nossas vidas. E as marcas, produtos, serviços, canais, pessoas, líderes e colegas que possam ser importantes nesse momento, criam um vínculo de longo prazo que condiciona comportamentos e atitudes com respeito a preferências e escolhas agora e por muito tempo mais. Por essa razão muitas empresas nesse período estão sendo cautelosas em oferecer algo que não seja institucional. Passado o momento mais agudo, ficará presente os que foram solidários e apoiaram e os que tentaram se aproveitar. E isso envolve temas inclusive como empresas que, aproveitando a alta demanda, aumentam preços para um equivocado benefício momentâneo. As ações sensíveis e positivas aumentarão o ativo intangível das empresas, marcas e negócios e, de outro lado, o comportamento mesquinho de melhoria de vendas e margens em meio ao quadro de absoluto estresse ficará marcado no longo prazo das relações com as pessoas.

É líquido e certo que a complexidade do comportamento humano é grande demais para, ambiciosamente, listar apenas alguns tópicos para reflexão sobre o que veio para ficar em termos de ações, atitudes, valores, percepções e reações de consumidores.

Mas é um ponto de partida, pois se a hipervolatilidade do ambiente já ensejava atenção plena e constante sobre seus reflexos no comportamento dos consumidores, ela agora é exponenciada pelas transformações do momento que determina ainda maior atenção e capacidade de reação. Tomem isso como um convite à discussão. O futuro de nossas relações, posicionamento, comunicação e propostas, passa por tudo isso. Fonte: artigo de Marcos Gouvêa, publicado na ProXXIma



Artigos Relacionados

O QUE ESPERAR DO CONSUMIDOR EM 2022?

O mundo nunca mudou em um ritmo tão intenso. Se, antes da pandemia, as transformações já aconteciam a todo vapor, agora, esse processo está ainda mais […]

A IMPORTÂNCIA DOS KPIS INDICADORES PARA MEDIR A SATISFAÇÃO DO CLIENTE.

A revolução digital e o intenso processo de utilização de canais digitais de venda, marketing e relacionamento reforçaram a necessidade de definição de indicadores KPIs de satisfação do cliente, uma das partes mais fundamentais da jornada e resultado da experiência. O tradicional Net Promoter […]

10 TENDÊNCIAS CRIATIVAS INTENSIFICADAS PELA PANDEMIA

Há quase quatro semanas, o isolamento social virou realidade para uma parcela da população. Nesse período, agências, marcas e criativos foram privados de seus recursos habituais, mas isso não amorteceu sua capacidade de criar. Temos visto tendências aparecerem e, em questão de dias, se tornarem cansativas, já que todos estão lutando para entregar mensagens que se conectem com o público. Aqui está uma […]