O QUE BELO-HORIZONTINOS ESTÃO APRENDENDO COM A QUARENTENA

“Vou viver com mais calma, um dia depois do outro”

Janaina Costa
Bailarina, 42 anos

Um recomeço. A epidemia do novo coronavírus deixou a sensação de que o mundo ganhou mais um marco: a vida antes da Covid-19 e depois a doença. Em 2020, a síndrome respiratória aguda trouxe o medo, o afastamento social, revelou fragilidades do nosso sistema de saúde, mas também transformou hábitos, modificou rotinas, tirou antigos projetos da gaveta, estimulou a solidariedade e até uma nova forma de pensar. Nesta reportagem você vai conhecer como a Covid-19 provocou transformações na vida de empreendedores, famílias, profissionais da saúde e dos mais velhos, criando uma onda de bons sentimentos. Quais dessas transformações serão fortes o suficiente para seguirem firmes na próxima temporada? Você já parou para pensar com quais os pontos positivos quer seguir em frente? 

A bailarina Janaina Castro sempre teve muita energia. Ela costuma fazer várias coisas intensas ao mesmo tempo e, por isso, ficar em casa, longe da família, dos amigos e do público exigiu calma para desacelerar. Mãe do Gael, de 5 anos, ela divide o tempo entre os ensaios e apresentações do Grupo Corpo, onde tem uma jornada de dedicação e disciplina, suas atividades como professora e a rotina em sua empresa. “A energia me move.” Com uma rotina tão ativa, Jana, como é chamada pelos amigos, consegue se organizar em uma coreografia que funciona. Na quarentena foi um susto. Precisou de repente, parar. Os primeiros 30 dias sem sair de casa, ela levou bem. Praticou e estudou ioga, fez atividades físicas, brincou bastante com o Gael… Juntos eles assistiram filmes, fizeram as tarefas da escola, montaram espetáculos. “Como meu filho também tem muita energia, ele me salvou.” Mas com o passar das semanas o sentimento mudou. “Fiquei um pouco mais preguiçosa e insone. Sentia que precisava sair um pouco, mesmo que fosse apenas para ir ao supermercado.” Nesse momento que se tornou melancólico Jana contou muito com o acolhimento do marido e do filho. “Foi um tempo importante porque ressaltou o que é sutil, como estar perto da família.”  Valorizar esses momentos trouxe reflexões novas. “Acho que o Gael se lembrará do coronavírus como uma época feliz, na qual ele teve muita atenção dos pais.” Agora, em outra fase da pandemia, Jana se sente em equilíbrio. “Não estou correndo e nem melancólica.” Ela considera que o vírus ressaltou como nossas ações impactam na vida de outros. Além disso, a incerteza do momento fez mostrar que o futuro é de muitas formas imprevisível. “Sou muito disciplinada e acredito que essa lição vou levar comigo: viver com calma, um dia depois do outro.”


“A telemedicina virou caminho sem volta”

Daniel Ribeiro, 
48 anos, Médico

Depois da Covid-19, que colocou em alerta o sistema de saúde, algo vai mudar no consultório de Daniel Ribeiro. Ele precisará ter um telefone disponível para a teleconsulta, novo modelo de atendimento, autorizado pelas autoridades de saúde durante a pandemia e que até então não existia em seu segmento. Daniel é médico hematologista no Sistema Único de Saúde (SUS) e diretor do laboratório São Paulo, onde são feitos testes para detectar o contato do organismo humano com o coronavírus. Seu trabalho, portanto, se tornou ainda mais desafiador nos últimos meses. A pandemia criou a necessidade do atendimento à distância para pacientes que não podiam se locomover até o ambulatório. “Com essa medida emergencial, percebemos que é possível otimizar a consulta, principalmente para aqueles que se deslocam de cidades vizinhas para mensalmente ajustar suas medicações.” A resolução, a princípio simples, desafogou ambulatórios e abriu espaço para mais pessoas serem atendidas. “Acredito que esse será outro caminho sem volta”, diz Daniel. A Covid-19 já trouxe muitas mudanças para a rede de saúde e o lado positivo disso tudo é que o uso de mais tecnologia nas consultas poderá daqui para frente desafogar também os prontos atendimentos dos hospitais. Daniel acredita que no mundo pós-covid a teleconsulta terá ajustes e será devidamente remunerada, o que deve ajudar a oferta a crescer. Nos laboratórios, os testes também serão cada vez mais aprimorados. “Acredito que o medo que sentimos agora de nos aproximarmos uns dos outros irá passar, mas bons hábitos como lavar as mãos, trocar os sapatos e as roupas ao entrar em casa, estes ficarão.”


“Passei a valorizar ainda mais o trabalho feito por mulheres”

Iza Haddad, 42 anos
Psicanalista

Um dos recursos que Iza Haddad usou para enfrentar o distanciamento social foi buscar objetos que a fizessem ficar feliz com ela mesma. “Gosto muito de conviver com outras pessoas, por isso sou psicanalista”, diz ela. No início, foi desafiador encarar a solidão da quarentena. Para superar a falta dos vizinhos, dos colegas e amigos, dos familiares e até dos comerciantes que encontra ao circular a pé pelas ruas de Belo Horizonte, ela reencontrou seus trabalhos manuais como pintura, costura, além de enriquecer a horta doméstica e ter mergulhado na escrita e na leitura. “Também passei a valorizar ainda mais o trabalho feito por mulheres.” Pesquisadora do feminino na psicanálise, Iza conta que durante o afastamento social intensificou o consumo de produtos artesanais produzidos no comércio local, tanto de Minas como de outros estados: uma atitude que deve seguir com ela.  Pensando em ajudar o próximo, Iza acelerou durante a quarentena um projeto que vinha planejando, para atender mulheres em situação de vulnerabilidade social, que não podem pagar pela psicanálise. Os agendamentos serão feitos em seu instagram @uma-mulher-e-seu-diva. “Para mim, a pandemia veio firmar a ideia de que precisamos doar aquilo que temos de importante e que fazemos de melhor, como o nosso trabalho.” E quem disse que o mundo não pode melhorar?


“Intensificar os trabalhos manuais e a culinária me fizeram manter o bom humor”

Dinorah Távora, 79 anos
Decoradora aposentada

Dinorah Távora é a alegria da casa. Enquanto espera por setembro, mês em que fará 80 anos, ela segue firme em uma rotina onde o mais importante é manter a esperança viva. “Sinto que sou como uma luz, sempre muito alegre. Se eu desanimar, minha família também desanima.” Mãe de quatro filhos e cinco netos, ela é consciente de seu papel. Por isso, durante a pandemia, vem resistindo bem no distanciamento social. Para manter o bom humor, a boa saúde e os pensamentos positivos, apesar da saudade dos familiares e dos amigos, ela intensificou os trabalhos manuais e a culinária. Tenta também dosar as preocupações. “Tenho três netos morando fora do país.” Uma neta trabalha em multinacional na Itália e dois netos estudam medicina nos Estados Unidos. “Agora me sinto mais tranqüila quanto a eles, acho que o pior passou.” Quando era criança, Dinorah viveu efeitos do pós guerra. Em 1946, aos 6 anos, se recorda que faltava pão. “Quando meu avô, que tinha uma fábrica de macarrão em São Paulo, nos enviava farinha de trigo, era uma festa na vizinhança.” Ainda criança, ela também venceu a pneumonia: “Fui salva pela penicilina que tinha acabado de ser descoberta”. Dinorah também enfrentou governos e ditaduras, mas considera que o coronavírus foi o mais desafiador e que irá provocar grandes mudanças no mundo. “Acredito que as pessoas e os países se tornarão mais cuidadosos uns com os outros e mais simples também.” Sem abandonar o otimismo ela, que já sentia ter passado por uma transformação pessoal impulsionada pelas vítimas de Brumadinho e das enchentes, agora tem se tornado ainda mais generosa. “Esse é o sentimento que precisa crescer no mundo.”


“Pretendo nunca mais deixar de meditar”

Lui Filho, 32 anos
Empreendedor

Um só, não. Vários desafios foram vencidos por Lui Filho. Educador físico, ele precisou buscar força para superação pessoal e profissional, já que sua academia, The Beat Training, no Vila da Serra, foi fechada para cumprir o distanciamento social. “Nesse período, tive de aprender a controlar minhas emoções.” Sabendo que os sentimentos refletem de modo inconsciente em nossa saúde, a primeira ação do professor, que de longe transborda energia positiva, foi criar uma campanha em seu instagram: #notíciaboa. “Cansado de ver coisas ruins, encorajei meus seguidores a buscar informações positivas.” E deu super certo. “Aos poucos começamos a vibrar em uma outra frequência e até as minhas decisões com relação a minha empresa se clarearam”, conta Lui. O período ressaltou a importância de viver o presente, valorizar a família, além de proporcionar um novo jeito de fazer girar o seu negócio. Lui criou uma plataforma de atividades online, onde o aluno adere à mensalidade e tem um extenso cardápio de aulas variadas. O produto funcionou bem e já conta com mais de 500 pagantes em vários países do mundo. “Não precisamos demitir ninguém e nem suspender o contrato de nenhum funcionário.” Mas de toda a temporada coronavírus o principal para ele foi aprender a meditar. “Essa prática me fez enxergar o mundo e as pessoas de uma forma diferente.” Se ele vai levar o aprendizado adiante? “Pretendo nunca mais deixar de meditar.” 

Fonte: Revista Encontro


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